30 julho 2007

Contemplação e dependência

“ A contemplação não é apenas um aprofundamento da experiência, mas também uma mudança radical na nossa maneira de ser e de viver, e a essência dessa mudança é precisamente uma libertação da dependência em relação a meios externos para fins externos. É claro que se pode dizer que uma abertura das ‘portas da percepção’ não é algo totalmente ‘externo’; no entanto, é uma satisfação que pode acabar suscitando uma necessidade habitual e da qual se pode ficar dependente. A verdadeira contemplação liberta de todas essas formas de dependência. Nesse sentido, parece-me que uma vida contemplativa que dependa do uso de drogas é essencialmente diferente de uma que implique libertação da dependência em relação a tudo o que não seja a liberdade e a graça divina. Sei que estas poucas observações não respondem à real indagação [sobre drogas e contemplação], mas expressam minha própria dúvida.”

Faith and Violence: Christian Teaching and Christian Practice, de Thomas Merton
(University of Notre Dame Press, Notre Dame, Indiana), 1968, p. 217
Reflexão da semana 30-07-2007

Um pensamento para reflexão: “Nossa sociedade tecnológica não tem mais lugar para a sabedoria que busca a verdade por si mesma, que busca a plenitude do ser, que procura repousar em uma intuição do próprio chão de todo ser. Sem sabedoria, a aparente oposição entre ação e contemplação, entre trabalho e repouso, entre envolvimento e desapego nunca pode ser resolvida.”
Faith and Violence, Thomas Merton

23 julho 2007

Amortecimento da consciência

[Carta a Jean e Hildegard Goss-Mayer]

“ As vezes é desalentador ver como é pequeno o movimento pacifista cristão, especialmente aqui nos Estados Unidos, onde é mais necessário. Mas temos de lembrar que este é o padrão habitual, e a Bíblia leva-nos a esperar que seja assim. O trabalho espiritual é feito com instrumentos desproporcionalmente pequenos e fracos. E sobretudo agora, quando tudo é tão profundamente complexo, e quando as pessoas desmoronam sob o fardo de confusões e param por completo de pensar, é natural que poucos estejam dispostos a assumir o ônus de tentar realizar algo, da maneira moral e espiritual, na ação política. Mas é precisamente isto que necessita ser feito.

O grande perigo é que, sob a pressão da ansiedade e do medo, com a alternância de crise e relaxamento e nova crise, as pessoas do mundo acabem aceitando aos poucos a idéia de guerra, de submissão ao poder totalitário e da renúncia à razão, ao espírito e à consciência individual. O grande perigo da guerra fria é o amortecimento progressivo da consciência.

Deposito muita confiança em sua ajuda e amizade. Envie-me qualquer coisa que, a seu ver, possa servir à causa da paz, e reze para que, em tudo, eu possa agir com sabedoria.”

The Hidden Ground of Love, Letters, de Thomas Merton
Editado por William Shannon
(Ferrar, Straus, Giroux Publishers, New York ), 1985, p. 325-326
Reflexão da semana de 23-07-2007

Um pensamento para reflexão
: “Hoje é a festa de Santo Hilário [14 de janeiro], Doutor da Igreja, que disse: ‘A melhor maneira de resolver o problema de dar a César o que é de César é não ter nada que seja de César.’”
The Hidden Ground of Love, Thomas Merton

16 julho 2007

Dizer 'sim' quando possível

“ A heresia do individualismo: crer-se uma unidade inteiramente auto-suficiente e afirmar essa ‘unidade’ imaginária contra todos os demais: a afirmação do eu apenas como 'não o outro'. O verdadeiro caminho é justamente o oposto: quanto mais eu for capaz de afirmar os outros, dizer-lhes ‘sim’ em mim mesmo, descobrindo-os em mim e a mim mesmo neles, tanto mais real serei. Sou plenamente real se o meu próprio coração disser sim a todos.

Serei melhor católico não se refutar todos os matizes do protestantismo, mas se puder afirmar a verdade que existe nele e ir além.

Assim também em relação aos muçulmanos, aos hindus, aos budistas, etc. Isto não significa sincretismo, indiferentismo, uma atitude amistosa vazia e despreocupada que tudo aceita sem refletir sobre nada. Há muita coisa que não se pode ‘afirmar’ e 'aceitar', mas primeiro é preciso dizer 'sim' ali onde é realmente possível.

Se eu me afirmar como católico apenas negando tudo que é muçulmano, judeu, protestante, hindu, budista, etc., no fim descobrirei que não resta muita coisa para afirmar como católico: e certamente nenhum sopro do Espírito com o qual possa afirmá-lo.”

Conjectures of a Guilty Bystander, de Thomas Merton
(Doubleday, New York), 1966. p. 144
No Brasil: Reflexões de um espectador culpado, (Editora Vozes, Petrópolis), 1970. p. 166
Reflexão da semana de 16-07-2007

Um pensamento para reflexão: “Se eu não tiver unidade em mim, como poderei pensar, e menos ainda em falar, em unidade entre cristãos? Mas é claro que, procurando a unidade para todos os cristãos, consigo também em mim a unidade.
Reflexões de um espectador culpado, Thomas Merton

09 julho 2007

Contemplação: Deus em nossa vida cotidiana

“ A contemplação é mais do que a mera consideração de verdades abstratas sobre Deus; mais, até, do que a meditação afetiva das coisas em que cremos. É um despertar, uma iluminação, e a compreensão intuitiva e maravilhosa, com que o amor se certifica da intervenção criadora e dinâmica de Deus em nossa vida cotidiana. A contemplação, portanto, não ‘encontra’ simplesmente uma idéia clara sobre Deus, confinando-o dentro dos limites dessa idéia, retendo-o como um prisioneiro a quem se pode sempre voltar. Pelo contrário, a contemplação é que é por Ele arrebatada e transportada ao seu próprio domínio, ao seu mistério, à sua própria liberdade. É um conhecimento puro e virginal, pobre em conceitos, mais pobre ainda em raciocínios, mas capaz, por sua própria pobreza e pureza, de seguir a Palavra ‘aonde quer que vá’.”

New Seeds of Contemplation, de Thomas Merton
(New Directions, New York), 1972. p. 5
No Brasil: Novas Sementes de Contemplação, (Editora Fissus, Rio de Janeiro), 2001. p. 12-13
Reflexão da semana de 09-07-2007

Um pensamento para reflexão: “A contemplação jamais poderá ser objeto de ambição calculada. Não é algo que planejamos obter por nossa razão prática; é a água viva do espírito de que estamos sequiosos como o cervo sequioso à procura das fontes cristalinas em pleno deserto.”
Novas sementes de contemplação, Thomas Merton

02 julho 2007

Oração e liberdade pessoal

“ A oração é a mais verdadeira garantia da liberdade pessoal. Somos mais verdadeiramente livres no livre encontro de nossos corações com Deus em Sua palavra e ao recebermos o Seu Espírito, que é o Espírito de verdade e liberdade . A Verdade que nos liberta não é uma mera questão de informação sobre Deus, mas a presença em nós, por amor e graça, de uma pessoa divina que nos leva a participar da vida pessoal íntima de Deus como Seus Filhos [e Filhas] adotivos. Esta é a base de toda oração, e toda oração deve estar voltada para este mistério da adoção na qual o Espírito em nós reconhece o Pai. O clamor do Espírito em nós, o clamor do reconhecimento de que somos Filhos [e Filhas] no Filho, é o cerne da nossa oração e o maior motivo de oração. Portanto, recolhimento não é exclusão de coisas materiais, e sim atenção ao Espírito no mais íntimo do nosso coração. A vida contemplativa não deve ser encarada como uma prerrogativa exclusiva dos que residem entre paredes monásticas. Todos podem procurar e encontrar essa consciência e despertar íntimos que são dons de amor e um toque vivificante de poder criador e redentor, do poder que ergueu Cristo de entre os mortos e que nos limpa das obras de morte para servirmos ao Deus vivo. Hoje com certeza é preciso enfatizar que a oração é uma real fonte de liberdade pessoal em meio a um mundo no qual somos dominados por organizações imponentes e instituições rígidas que só procuram nos explorar para obter dinheiro e poder. Longe de ser a causa da alienação, a verdadeira religião em espírito é uma força libertadora que nos ajuda a encontrar-nos em Deus .”

The Hidden Ground of Love, Letters, de Thomas Merton
Editado por William Shannon
(Ferrar, Straus, Giroux Publishers, New York ), 1985, p. 159
Reflexão da semana de 02-07-2006

Um pensamento para reflexão: “Deus procura a Si mesmo em nós, e a aridez e o pesar do nosso coração são o pesar de Deus que não é conhecido em nós, que não pode encontrar a Si mesmo porque não ousamos acreditar ou confiar na incrível verdade de que Ele pode viver em nós, e o faz por escolha, por preferência. Mas de fato existimos somente para isto: para sermos o lugar que Ele escolheu para Sua presença, Sua manifestação no mundo, Sua epifania.”
The Hidden Ground of Love, Thomas Merton