31 janeiro 2006

Livre por natureza


“ No último dia de janeiro de 1915, no signo de Aquário, num ano de grande guerra, debaixo das sombras de certas montanhas francesas na fronteira com a Espanha, nasci para o mundo. Livre por natureza, à imagem de Deus, era no entanto prisioneiro da minha própria violência e do meu próprio egoísmo, à imagem do mundo em que nasci. (…)
Meu pai pintava como Cézanne e captava a paisagem do sul da França como a captava Cézanne. (…) Meu pai era um ótimo artista.”
(…)
Eu herdei de meu pai seu modo de ver as coisas e um pouco de sua integridade, de minha mãe herdei o descontentamento pelas enrascadas em que o mundo se meteu e um pouco de sua versatilidade. Recebi de ambos a capacidade de trabalhar, visão, prazer e expressão que poderiam ter feito de mim uma espécie de rei, se os padrões de que vivia o mundo fossem legítimos.”

30 janeiro 2006

A ficção chamada “inimigo”

“ Aprendi que uma época em que os políticos falam sobre paz é uma época em que todos esperam guerra: os grandes homens da terra não falariam tanto de paz se não acreditassem secretamente que, com mais uma guerra, aniquilariam seus inimigos para sempre. Sempre, "após só mais uma guerra", raiará a nova era do amor: mas primeiro todos os que são odiados devem ser eliminados. Pois o ódio, entendem, é a mãe do que eles chamam de amor.

Infelizmente, o amor que deveria nascer do ódio nunca nascerá. O ódio é estéril; não gera nada além da imagem de sua própria fúria vazia, de seu próprio nada. O amor não pode vir do vazio. Ele é cheio de realidade. O ódio destrói o verdadeiro ser do homem ao lutar contra a ficção que ele chama de "o inimigo". Pois o homem é concreto e vivo, mas "o inimigo" é uma abstração subjetiva. Uma sociedade que mata homens reais para livrar-se do fantasma de uma ilusão paranóide já está possuída pelo demônio da destrutividade, porque se tornou incapaz de amor. Recusa-se, a priori, a amar. Não se dedica a relações concretas entre pessoas, mas apenas a abstrações a respeito de política, economia, psicologia, e até, às vezes, religião.”

The Collected Poems of Thomas Merton
(New Directions, New York), 1977. p. 374-75
Reflexão da semana de 30-01-2006

23 janeiro 2006

Seguindo nossa vocação

“ Sabemos que seguimos nossa vocação quando a nossa alma se vê livre de toda a preocupação consigo mesma e é capaz de procurar a Deus até encontrá-lo, embora possa parecer que não o acha. Gratidão, confiança e liberdade interior, eis os sinais de que achamos a nossa vocação e vivemos de conformidade com ela, ainda que o resto possa parecer que falhou. Isso nos dá a paz em qualquer sofrimento e nos ensina a rir do desespero. E podemos ter ocasião para tanto.”

No Man is an Island, de Thomas Merton
(Harcourt, Brace Jovanovich Inc., New York), 1955. p. 140
No Brasil: Homem algum é uma ilha, (Verus Editora, Campinas), 2003. p.127
Reflexão da semana de 23-01-2006

16 janeiro 2006

A salvação da sociedade!

“ Se a salvação da sociedade depende, a longo prazo, da saúde moral e espiritual dos indivíduos, o tema da contemplação passa a ser importantíssimo, pois a contemplação é um dos indicadores da maturidade espiritual. Está estreitamente ligada à santidade. Não se pode salvar o mundo apenas com um sistema. Não se pode ter paz sem caridade. Não se pode ter ordem social sem santos, místicos e profetas.”

A Thomas Merton Reader, editado por Thomas P. McDonnell
(Image Books, A Division of Doubleday @ Company, Inc. Garden City, NY), 1974. p. 375
Reflexão da semana de 16-01-2006

09 janeiro 2006

Aceitação

“ Devemos tentar nos aceitar, de modo individual ou coletivo, não só como perfeitamente bons ou perfeitamente maus, mas sim como uma misteriosa e indescritível mistura de bem e de mal. Temos que nos sustentar com o pouco de bem que abrigarmos em nós, sem exageros. Temos que defender nossos legítimos direitos, porque, se não respeitarmos nossos direitos, com toda certeza também não respeitaremos os direitos dos outros. Mas, ao mesmo tempo, temos de reconhecer que, deliberadamente ou não, violamos direitos de outros. Temos que ser capazes de admitir isso tanto como resultado de um auto-exame, mas também quando inesperadamente alertado por outros, talvez de forma não muito suave.”

A Thomas Merton Reader, editado por Thomas P. McDonnell
(Image Books, A Division of Doubleday @ Company, Inc. Garden City, NY), 1974. p. 315
Reflexão da semana de 9-01-2006

02 janeiro 2006

O poder do amor

“ O que nos é pedido é apenas uma coisa: amar; e, se algo pode consegui-lo, é certamente esse amor que há de tornar, tanto a nós quanto o próximo, dignos.

De fato, isso é uma das coisas mais importantes em matéria de amor. Não existe neste mundo outra maneira de tornar alguém digno de amor senão amando-o. Logo que alguém reconhece ser amado – se não é tão fraco que não suporte mais ser amado – sente-se instantaneamente transformado e a caminho de ser digno de amor. Procurará, então, corresponder, extraindo das profundezas do seu ser um misterioso valor espiritual, uma identidade nova, chamada a existir pelo poder do amor que lhe é dedicado.”


Disputed Questions, de Thomas Merton
(Harcourt Brace Jovanovich, Publishers, New York), 1960. p. 125
No Brasil: Questões abertas, (AGIR, Rio de Janeiro), 1963. p. 145
Reflexão da semana de 2-01-2006