Prefácio do Autor
ESSE livro contém material consideravelmente aumentado e
revisto sobre direção espiritual e meditação, publicado em artigos mensais na
revista Sponsa Regis. A primeira parte se dirige ao cristão, particularmente
aos religiosos e religiosas, que procuram um guia espiritual, ou já o possuem,
e desejam aproveitar ao máximo das vantagens dessa direção. Espera-se, ao mesmo
tempo, que alguns padres demasiadamente tímidos para se considerarem “diretores
espirituais” em potencial possam, ao ler estas páginas, aprender a dominar sua
natural hesitação e, contando com a ajuda de Deus, sentirem-se animados a dar
conselhos e estímulo no confessionário, quando se apresentar a oportunidade.
Espera-se, ainda, que algumas ideias demasiadamente rígidas e estereotipadas sobre direção espiritual possam ser parcialmente desfeitas por um dos pontos visados nestas páginas. Trata—se de não considerar o guia espiritual como máquina mágica, apta a resolver casos e problemas, e dotado do poder de declarar qual seja a santa vontade de Deus, sem a menor possibilidade de um apelo em contrário. Espera-se mostrar que o guia espiritual é um amigo em quem se confia que, numa atmosfera de compreensão e simpatia, nos ajuda e fortalece em nossos esforços, nosso tatear, para corresponder à graça do Espirito Santo, que é o único verdadeiro Guia no sentido pleno da palavra.
Damos, também, ênfase ao fato de que a graça constrói sobre
a natureza. Aproveitaremos melhor da direção espiritual se formos encorajados a
desenvolver nossa simplicidade natural, nossa sinceridade, nossa franqueza e
nossa integridade espiritual. Em uma palavra, a sermos “nós próprios“ no
sentido mais elevado do termo. Assim, a utilização sadia e generalizada desse
importante meio de chegar a perfeição auxiliará os cristãos a manter um contato
vital com a realidade de sua vocação e de sua vida, em lugar de se perderem num
emaranhado de ficções devotas.
A segunda parte do livro é composta de notas sobre a
meditação. Foram escritas em 1951 como uma espécie de companheira à brochura
“Que é a Contemplação?” Depois de datilografadas, foram postas de lado e
esquecidas. Agora vêm à luz. Com retoques e correções. Não se pode aprender a
meditar por meio de um livro. É preciso simples mente meditar. Mas podemos
todos concordar em que algumas sugestões, no momento propicio e com as palavras
adequadas, serão talvez, de grande eficácia.
Esperamos que essas páginas possam ajudar alguém que ainda
não conseguiu encontrar em outros livros aquilo de que estava necessitando
sobre o assunto. É razão suficiente para a sua publicação, supondo não haver
nada de radicalmente errado na exposição que damos. Não deveria haver. O assunto
é perfeitamente tradicional e conhecido. A única característica particular do
tratamento que damos é a ausência de formalidade e a aversão aos sistemas
convencionais e rígidos. Não que haja algo de errado nesses sistemas de
meditação - e certamente a aversão aos sistemas não deve ser interpretada como
repugnância pela disciplina. A disciplina é da maior importância, sem ela
meditação alguma séria jamais será possível. Contudo deve ser a nossa própria
disciplina não uma rotina imposta mecanicamente de fora.
Aqui, pois, estão estas páginas que não pretendem ser completas,
perfeitas ou exaustivas. Tocam apenas em alguns pontos importantes que qualquer
pessoa precisa compreender antes de poder meditar realmente bem. Em nenhum
lugar dessas notas insisti em que a meditação fosse importante, e em lugar
algum procurei impingir a alguém a ideia de meditar. Isso porque são coisas consideradas
normais. Este livre não se destina a pessoas que não desejem meditar. É para os
que já acham interessados e gostam do meditar diariamente.
O fator desejo é, evidentemente, de extrema importância. Uma
das razões principais de não chegarem pessoas que se consagram diariamente à
meditação a algo positivo é que a ela se entregam sem grande entusiasmo, sem
interesse sério. É evidente que, não possuindo alguém o desejo real de meditar,
não terá êxito algum. Pois aqui, antes de mais nada, o trabalho tem de ser
feito por nós mesmos, ajudados pela graça de Deus. Nenhuma outra pessoa nos
pode substituir nesse assunto.
Abadia de Gethsemani
Outono, 1959
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